As medidas de simplificação, redução e eliminação das obrigações tributárias não são meras iniciativas desburocratizantes, mas pilares do Estado Democrático de Direito.
A opção encontrada pela Constituição para superar o ‘carnaval tributário’ ou ‘manicômio tributário” foi simplificar as obrigações tributárias dos pequenos negócios para que eles prosperassem, viabilizando a criação do Simples Nacional.
Incentivar os pequenos negócios, segundo a Constituição, refere-se a assegurar a formalização, permanência e possibilidade de expansão de todos eles como protagonistas de ações voltadas para a diversificação, dinamismo e robustez do mercado.
Reduzir as desigualdades sociais é um dos objetivos fundamentais da República, com o fim de assegurar existência digna também aos pequenos empresários.
A versão inicial do Refis (Pert) sem atender as MPE é inconstitucional por ferir o direito dos pequenos ao tratamento favorecido e diferenciado. O Refis das MPE assegura a igualdade exigida pela Constituição. As razões do veto são inconsistentes.
O raciocínio do veto de que os optantes do Simples não podem desfrutar de outros direitos previstos na Constituição choca-se com a jurisprudência do STF. Interpretar o Simples Nacional como uma “condenação” é um erro.
A postura do Congresso ao aprovar o Refis das MPE resolveu a ofensa contra a igualdade tributária que resultaria – e resultará se não derrubado o veto – em uma enorme corrida dos pequenos negócios ao Poder Judiciário para defender seus direitos lesados.
A derrubada do veto ao Refis das MPE é uma medida legítima e necessária para correção da exclusão do parcelamento dos pequenos, sem qualquer razão justa. Assim fazendo, o Congresso Nacional estará exercitando o seu papel de guardião da Constituição, também proibindo o excesso. Fará concretizar a ideia de justiça por meio de um juízo simples de proporcionalidade.
É incorreto o veto quando afirma a necessidade de submeter a proposta ao Confaz, uma vez que nem a Lei Geral das MPE, nem a Constituição, entregou a esse órgão o domínio sobre o tratamento favorecido e diferenciado aos pequenos negócios.
É equivocado tratar o Simples Nacional como “gasto tributário”, conforme o STF. Ele não pode ser tratado como exceção ao regime geral tributário, mesmo porque inexiste definição normativa sobre o conceito de gasto tributário ou renúncia fiscal.
O Simples Nacional é um microssistema tributário, não podendo a Constituição ser entendida como um desvio da estrutura normal de tributação. Ele tem caráter geral, amplo, impessoal e não-condicionado. Tudo em sua estrutura o distancia de ser considerado benefício fiscal.
Sempre que a Receita Federal, o Tesouro Nacional ou qualquer outra instância enxergar políticas constitucionais de discriminação positiva – como o Simples – como “gasto tributário”, “benefício fiscal” ou “renúncia de receita”, ao contrário de compreendê-las como concretização pura e simples do princípio da isonomia, estarão realizando uma “leitura em pedaços da Constituição Federal”.
O STF tem posição no sentido de que o Simples Nacional tem natureza própria, originada da Constituição, não podendo ser confundido com benefício fiscal.
A derrubada do veto deve ser vista como legítima busca de justiça tributária. Pedem os pequenos negócios apenas o cumprimento da Constituição Federal. Os grandes tiveram sua chance de reorganizarem seus compromissos tributários, os pequenos, não. Os grandes já tiveram outras inúmeras oportunidades, os pequenos apenas uma, sem as condições mais benéficas dos grandes.
A omissão de aprovação do Refis das MPE viola o dever de cada Deputado e Senador guardar a Constituição. Seria uma omissão política com consequências jurídicas drásticas, especialmente a privação de direitos a quem constitucionalmente os detém, as micro e pequenas empresas.
Não há alternativa no horizonte institucional do Congresso Nacional que não seja derrubar o veto. Seria atentar contra o princípio democrático e os objetivos constitucionais de construir uma sociedade livre, justa e solidária, além da valorização do trabalho humano e da livre iniciativa como pilares da ordem econômica.
O veto ao Refis das MPE ao negar vigência ao tratamento favorecido e diferenciado para os pequenos negócios e, além disso, conferir tratamento explicitamente anti-isonômico em relação aos médios e grandes, promove um quadro de injustiça tributária, que deve encontrar no Congresso Nacional limites contra suas graves consequências.
A justiça, que se apresenta também como justiça tributária, não é uma fantasia, ou um ideal distante. É um direito. Um direito constitucional.
A íntegra do parecer pode ser acessada por meio do link: http://refisparaospequenos.com.br/.